O sangue une
e desune
sangrando torto
sangrando estrume
o olho morto
te mete ao cume
sem teu conforto
não há quem fume
no velho porto
ninguém assume
no chão retorto
o semimorto.
21 horas e 48 minutos de 27 de setembro de 2011.
O sangue une
e desune
sangrando torto
sangrando estrume
o olho morto
te mete ao cume
sem teu conforto
não há quem fume
no velho porto
ninguém assume
no chão retorto
o semimorto.
21 horas e 48 minutos de 27 de setembro de 2011.
Sou preto na pele;
e só.
Sou preto na cor,
sou branco no jeito,
sou branco na fala,
sou branco nos trajes,
sou branco no carro.
Meu sangue é preto,
minh'alma é branca.
Minha noiva é branca,
minha carteira é branca.
De preto só a pele;
e só.
15 horas e 6 minutos de 4 de outubro de 2011.
Arrancaram os pinheiros
e montaram acampamento
de uniforme cinzento
ergueram primeiro as paredes
de tinta branca
pintaram as lajotas e os tijolos
e com piso amadeirado
revestiram o assoalho.
Só sobraram as araucárias
que a lei não deixou cortarem
e aonde viviam os passarinhos
agora farão os homens seus ninhos
num belo quarto residencial.
10 horas e 37 minutos de 5 de setembro de 2011.
Aquele cara não parava de falar.
Contava suas viagens para Europa, para África e pela América Latina.
Filho da puta!
Não parava de tagarelar o desgraçado.
E o calor dentro do ônibus esquentava o até o cu de quem estava sentado.
O sangue me subiu à cabeça, mas esperei pra ver se cansava. Não parou.
Não teve jeito, prendi o lazarento no chão e com minha faca de incisão estourei teu peito e ranquei-lhe o coração.
Pulsando em minha mão o coração do desgraçado, mesmo assim tua língua continuava se mexendo.
Cortei-lhe a língua.
E não é que o filho da mãe ainda soltava uns barulhos pela goela, e o sorriso não saia da tua cara.
Que podia fazer, esquartejei o homem todo, em pedacinhos mil. O sangue corria pelo corredor do ônibus, as pessoas se enojavam com aquele cheiro, mas eu me sentia tão bem.
Tranquilo, e agora finalmente em silêncio, joguei os pedacinhos na beira da estrada para que os urubus do cerrado se deliciassem.
13 horas e 20 minutos de 13 de setembro de 2011.
Pingos de lágrimas de água salgada
molham os olhos brilhosos holísticos
goles de gotas em galés da vida
sinais da insinuante sina
gritos de guerra nas guelras
dum peixe humano e patético
moléculas que te molestam
atirem os átomos no pátio da escola
laços lentos e bem lidos
vínculos bem veiculados
estórias pouco históricas
setenta e cinco em suma
glória e garra cuspidos
estouros que estalam o estorno.
1º de setembro de 2011.
Enquanto todos se divertem, eu aqui enclausurado numa sala de estar, bem embrulhado o estômago, esperando passar a fome de ser quem não sou, de ir aonde não vou, de cheirar o que já se foi e de enxergar o que ainda não foi.
Se a janela da jaula bem fechada estourasse por si só os cadeados enferrujados, poderia ver o feixe de luz que vejo, como um céu ensolarado com luz viva de liberdade.
E se o teto caísse abaixo da cabeça abaixada, cortaria logo fora o pescoço dependurado sob a coluna vertebral bem inclinada, e aí poderia olhar pra cima e tocar em Deus, de que até agora só ouvi palavras.
Mas primeiro com uma serra serraria os tornozelos presos na terra, para que com os tocos de pernas pudesse correr pra fora da caverna de ilusões internas.
E se mesmo assim não fosse livre, mutilava os ouvidos, a narina e os olhos, então sentiria a brisa fina na face ensanguentada, e não veria nunca mais a face das pessoas devastadas, não sentiria o cheiro mórbido da cidade putrificada, nem ouviria essas horríveis vozes engasgadas.
E se nada disso adiantasse, purgava a alma até secar-se, com o sangue dava descarga, com o pó jogava na água.
1 hora e 40 minutos de 8 de março de 2011.
Um homem sem dentes gritava na rua
gritava e ninguém ouvia
chamava o cão que ali do lado latia
em meio a fomes, ferpas e firmas
um mano chocalho passou
mal olhou e pouco se admirou
o cão distraído também nem ligava
para o homem que a tanto gritava
o homem se sentindo traído
desistiu do intenso ruído.
12 horas e 43 minutos de 5 de setembro de 2011.