Preso

Preso (ou Estandarte da Morte)


Enquanto todos se divertem, eu aqui enclausurado numa sala de estar, bem embrulhado o estômago, esperando passar a fome de ser quem não sou, de ir aonde não vou, de cheirar o que já se foi e de enxergar o que ainda não foi.

Se a janela da jaula bem fechada estourasse por si só os cadeados enferrujados, poderia ver o feixe de luz que vejo, como um céu ensolarado com luz viva de liberdade.

E se o teto caísse abaixo da cabeça abaixada, cortaria logo fora o pescoço dependurado sob a coluna vertebral bem inclinada, e aí poderia olhar pra cima e tocar em Deus, de que até agora só ouvi palavras.

Mas primeiro com uma serra serraria os tornozelos presos na terra, para que com os tocos de pernas pudesse correr pra fora da caverna de ilusões internas.

E se mesmo assim não fosse livre, mutilava os ouvidos, a narina e os olhos, então sentiria a brisa fina na face ensanguentada, e não veria nunca mais a face das pessoas devastadas, não sentiria o cheiro mórbido da cidade putrificada, nem ouviria essas horríveis vozes engasgadas.

E se nada disso adiantasse, purgava a alma até secar-se, com o sangue dava descarga, com o pó jogava na água.


1 hora e 40 minutos de 8 de março de 2011.

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